11 novembro, 2014

Alma Flamejante - Introdução e Prólogo

Introdução
No início dos tempos, Deus criou o universo e, com o Seu poder, fez surgir vários mundos das mais diversas naturezas. Entre eles, estava Huppethay, um mundo repleto de magia.
Este mundo era um lugar pacífico dotado de florestas, montanhas, planícies, desertos, entre outros tipos de formações. Em todos estes, havia algum tipo de ser vivo habitando.
Naquele mundo, havia oito raças humanóides que faziam com que aquele mundo se movimentasse. Cada uma tinha as suas próprias peculiaridades e importância para o desenvolvimento daquele planeta.

Huppethay estava vivendo um momento muito complicado em sua história. O lugar, que fora um lugar muito pacífico em sua criação, com as raças vivendo em harmonia, atravessava uma guerra sangrenta que já se estendia por cerca de trinta mil anos.
O tempo de guerra era tão grande que três gerações de elfos, aproximadamente, nasceram e morreram sem ter a chance de ver a paz. Com relação aos humanos, o período de batalhas já se estendia havia tantos anos que a maioria acreditava que o mundo sem lutas era irreal, impossível de ser alcançado, e jamais havia existido no mundo onde viviam.
A guerra era travada basicamente entre gorgonites e latromis, mais conhecidos como elfos entre os humanos, e cada um contava com aliados na tentativa de vencer. Apenas os poderosos nächtliche, os brutos ogros e os indiferentes sistons optaram por manter neutralidade na disputa.
Huppethay se dividia em dois continentes imensos. Os gorgonites haviam dominado o Lado Oeste, como era chamado pelos humanos, que era repleto de planícies, desertos e formações montanhosas e contava com pouquíssimas florestas. Já os latromis mantinham o controle sob o Lado Leste, assim chamado pela raça humana, que era portador de mais de noventa por cento das florestas de Huppethay e também era rico em montanhas e planícies.
Em tempos mais remotos, os latromis habitavam todo o mundo, mas os gorgonites foram os responsáveis por expulsá-los do Lado Oeste, o que gerou a fúria dos derrotados. Além disso, para os latromis, a cidade de Konorpain, sua antiga capital, a qual está no coração do Lado Oeste, é considerada um lugar sagrado de suma importância.
Quando os gorgonites expulsaram os latromis de lá, eles jamais destruíram um único templo dos habitantes anteriores, porém, proibiram os mesmos de cultuarem no local, o que os desagradou profundamente e foi visto como uma forma de provocação. Mais ainda havia uma coisa pior a ser feita contra os latromis.
Konorpain significava “Celestial” na Língua Sagrada dos Latromis, conhecida como élfico. Os gorgonites, sabendo disso, cometeram o que os latromis chamaram de Ksamo Rutsome, “Crime Supremo”: mudaram o nome daquela cidade. Esta passou a se denominar Vaetr, que significa “Morte” em elfês, a Língua Coloquial dos Elfos.
Apesar dos esforços de ambos os lados, a guerra teimava em não acabar. Latromis triunfavam repetidamente quando o assunto era Lado Leste, porém eram os gorgonites que venciam todas as lutas no Lado Oeste. Dessa forma, nenhum dos exércitos avançava e a guerra continuava estável.

Os humanos eram a raça que vivia a situação mais delicada perante a guerra. A população, que já fora equivalente a dez por cento do total de Huppethay antes da guerra, já representava apenas um por cento do total e continuava diminuindo.
Culturalmente, os humanos mantinham duas características peculiares: o descaso da nobreza com a plebe, fato estranhado por outras raças, e a descrença das pessoas relacionada à existência da magia. Fato que ocorria devido a um rei em tempos remotos que havia julgado que magia era uma coisa perigosa e a proibira para uso popular. Muitas gerações depois, o povo esqueceu-se da mesma.
A principal religião humana girava em torno de um ser onipotente chamado Deus. Esta era chamada de Martírio e pregava o auto-sacrifício como forma de alcançar a graça divina.
A capital dos humanos era a cidade de Humania. Esta era a única habitação humana em todo o planeta com saneamento básico. Ali estavam abrigados noventa por cento dos seres daquela raça.
Ironicamente, o maior trunfo que um humano poderia ter em uma guerra seria a magia. Esta raça, entre todas que habitam Huppethay, é a com maior facilidade para o desenvolvimento dessa habilidade.
A raça humana era mal vista pela maioria das demais. A proibição da magia, que era considerada sagrada pela maior parte das outras raças, era um dos principais motivos.
Os hopenkloses, chamados pelos humanos de anões, consideravam essa raça um grupo de seres incapazes de raciocinar coisas óbvias e que, por esse motivo, pereceriam na guerra. Eles também achavam que a forma como os nobres daquela raça tratavam a plebe beirava o ridículo.
Os latromis, conhecidos como elfos pela humanidade, tinham opiniões divergentes, mas o consenso era um sentimento de pena. Eles julgavam que, por terem abandonado a magia e começado a destruir a natureza para sobreviver, a raça estava a sofrer uma punição divina constante e torciam para que um dia, os humanos entendessem seus erros e passassem a viver de uma forma agradável a Ksarpe.
Os krudes, conhecidos pelos humanos como orcs, tratavam os humanos com a mais fria indiferença. Esta raça classificava os humanos como verdadeiros criminosos pela forma como estes tratavam os seus semelhantes e os consideravam indignos de qualquer compaixão a partir do fato de que se eles não conseguiam tratar bem seus próximos, não havia motivos para fazer isso a outras raças.
Os gorgonites, assim chamados por todas as raças, não alimentavam quaisquer opiniões sobre as outras. Estes eram apenas os oponentes que os afastavam de seus ambiciosos objetivos e, por isso, deviam ser completamente dizimados.
Os brtes, os quais os humanos denominavam ogros, detestavam os humanos. Eles achavam que, por essa raça ter abandonado a magia, os deuses haviam se voltado contra ela e, portanto, eles deviam fazer o mesmo para que não fossem punidos também.
Os nächtliche, os quais os humanos chamavam de vampiros, simplesmente execravam os humanos. O primeiro motivo para a relação estremecida entre as raças era a forma que os homo sapiens usavam para se referir aos nächtliche: vampiros. Estes consideravam esse termo ofensivo um insulto à sua cultura e desprezavam profundamente os humanos por se referirem daquela maneira a eles.
A segunda razão era a magia, que, para os nächtliche era a maior manifestação de Herrgott em Huppethay e, por isso, devia ser adorada, e não banida. Eles consideravam isso algo grave o suficiente para cortar quaisquer relações com aquela raça.
Finalmente, os nächtliche entenderiam se os humanos tratassem mal apenas indivíduos que não fossem inteiramente pertencentes à raça deles. Entretanto, para um nächtlich, tratar mal um puro-sangue, independentemente de classe social, era um crime hediondo que fazia com que os humanos merecessem tudo pelo que estavam passando.
Os sistons, que, como os gorgonites, eram chamados por todos da mesma forma, consideravam os humanos os únicos culpados pela sua situação. Para eles, ao desenvolver uma sociedade frágil, esta não foi capaz de resistir ao peso da guerra. Além disso, ao se livrar da magia, eles se desfizeram de sua principal forma de combater os gorgonites e foram massacrados.
Os humanos se viam como uma raça superior por não se entregar à ilusão da magia, a qual eles julgavam não existir. Eles também encaravam o sistema em que a nobreza massacrava a plebe completamente como algo natural: vontade divina.
Eles ignoravam a opinião negativa das outras raças sobre eles e consideravam que vinham de seres inferiores que não mereciam respeito. A situação em que eles se encontravam era vista como algo causado pela inveja alheia, mas que a punição divina viria para aqueles que ousavam se voltar contra o povo escolhido, forma que eles gostavam de usar constantemente para falarem de si mesmos.

Os latromis eram uma das principais frentes de guerra contra o ataque gorgonite. A raça, porém, encontrava dificuldades visíveis quando o assunto era reaver o que havia sido perdido no Lado Oeste, chamado de Vasaht por eles.
A população latromi era de cerca de trinta e cinco por cento da global. Apesar de que houve um aumento com relação à porcentagem anterior à guerra, a qual girava em torno de vinte e cinco por cento, o número absoluto populacional caiu consideravelmente devido às intermináveis batalhas.
A cultura dessa raça tinha muitos pontos interessantes. Entre eles, os que mais chamavam a atenção era o forte amor pela natureza e o índice mínimo de preconceito com relação a raças.
A maior religião entre o povo dessa raça é o Kipenakarme, que crê em uma Trindade Santa formada por Tia, Ksarpe e Ortásape Rilpe. A doutrina desta lembra a crença humana com a diferença que os latromis não se consideram absolutos entre as raças, mais iguais a todas as outras. Eles também valorizam imensamente seus templos e não permitem que esses sejam profanados sob hipótese alguma.
A capital dos latromis era a cidade de Zentera. Esta era, de fato, a maior cidade de Huppethay com uma complexa estrutura feita inteiramente com manipulação mágica de árvores.
Outra cidade latromi de destaque era Ekeilai, a qual era a sede da maior e melhor escola de magia de Huppethay, a Escola de Magia de Ekeilai. Lá eram formados magos de diversas raças que costumavam realizar serviços variados em prol da sociedade.
A raça verde, como eram conhecidos os latromis, tinha muitas habilidades para se orgulhar em um campo de batalha. Como espadachins, eles eram muito hábeis. Os magos daquela raça estavam entre os melhores. Entretanto, nada era tão poderoso entre eles como a arte do arco-e-flecha.
Os arcos latromis eram de eficácia tamanha em campo de batalha que, mesmo em números menores, eles conseguiam dizimar exércitos antes mesmo que estes pudessem alcançar os guerreiros para um combate corpo-a-corpo. Além disso, a agilidade de um ser daquela raça permitia que mais flechas fossem atiradas em um período menor de tempo.
Com relação a como os latromis eram vistos pelas outras raças, havia uma nítida divisão de opiniões. Alguns não gostavam deles pela forma liberal como tratavam as diferenças raciais, enquanto outras valorizavam o grande cuidado pregado por eles para com a vida de todas as criaturas.

Os nächtliche eram uma raça que detestava estar na frente de batalha. Eles evitavam declarar apoio a qualquer lado que fosse, porém, a situação vinha mudando devido aos constantes ataques gorgonites no Lado Leste, o qual eles chamam de Eisland.
Os nächtliche, também conhecidos como os elfos da noite, representavam cerca de quinze por cento da população total de Huppethay. Quando feita a comparação referente ao período anterior às batalhas entre latromis e gorgonites, esse número caiu consideravelmente.
Antes da guerra, os elfos da noite eram vinte por cento de Huppethay. O motivo que fez com que os nächtliche perdessem tantas vidas foi porque, pelo fato de terem se declarado neutros, fizeram com que os gorgonites os atacassem, já que a postura daquela raça era de atacar quem não fosse aliado.
Os costumes dos elfos da noite justificavam a alcunha. Além de serem seres basicamente noturnos, eles tinham um cuidado muito forte com a natureza. Entretanto, eram o oposto dos latromis com relação à miscigenação. Os nächtlich não toleravam a mistura entre raças diferentes sob quaisquer hipóteses.
Na sociedade daqueles indivíduos, o índice de sangue nächtlich que corresse nas veias de cada um, o qual podia ser medido através de magia, influenciava desde o tratamento recebido na rua até o emprego que podia ser obtido. Os puros-sangues, cem por cento nächtlich, gozavam de privilégios. Caso um destes quisesse se misturar com um ser de classe baixa ou de outra raça, ele precisava abrir mão de suas regalias, as quais eram muitas.
A religião nächtlich era um profundo mistério. Ninguém sabia como eram os ritos ou até mesmo no que eles acreditavam, pois era crime punido com pena de morte revelar esse tipo de conteúdo para não-seguidores da mesma.
A cidade estabelecida pelos elfos da noite como a sua capital era chamada de Wispano. Esta compreendia uma grande quantidade de nächtliche e tinha uma estrutura muito boa sob diversos aspectos, como saneamento básico, escolas tradicionais e de magia, agricultura, entre outras coisas.
Os elfos da noite eram exímios guerreiros e tinham habilidades notáveis em diversas áreas, mas duas especificamente se destacavam. Eles perdiam para humanos e latromis em magia em geral, mas quando o assunto era o elemento água, eles eram imbatíveis. Além disso, nenhuma raça manejava a espada de forma tão bela e hábil como os nächtliche.
Um fato curioso era que os elfos da noite eram afetados diretamente pela luz da lua. Era nos dias de lua nova que eles eram capazes de liberar seu máximo poder. Em dias de lua cheia, eles ficavam levemente mais fracos. Durante o dia, eles perdiam algo em torno de metade de suas capacidades de batalha.
A segregação racial forte conduzida pelos nächtliche fazia com que eles fossem extremamente mal vistos pela maioria das raças. Entretanto, todos os admiravam pelo fato de que, apesar dos preconceitos, a sociedade deles era uma das mais organizadas e o governo dos mesmos, um dos mais comprometidos.

Os gorgonites eram uma raça em evidência quando o assunto era a guerra em Huppethay. O conflito havia se iniciado a partir de ataques realizados pela raça azul contra todos os outros.
Ao longo do período sem paz, os gorgonites passaram a representar trinta por cento da população de Huppethay. Antes, a raça azul representava apenas quinze por cento da demografia daquele planeta.
Os ataques protagonizados pelos gorgonites por si só eram compatíveis com os hábitos agressivos daquela raça, porém, havia fatos estranhos. A raça azul era conhecida por não se agrupar. Os gorgonites eram nômades, viviam no deserto, e o maior grupo já visto até então havia sido de doze indivíduos.
Em um curto período antes do início da guerra, houve um agrupamento de milhares de gorgonites. Estes se organizaram e iniciaram os ataques.
Pouco se sabe sobre a cultura e a estruturação da sociedade gorgonite. Entretanto, há muito temor com relação à raça azul.
Eles subjugavam, exploravam e destruíam. Eles eram fonte de intenso terror em toda Huppethay.


O tempo passava e a guerra fluía. Eventos terríveis aconteciam diariamente. Embora estivessem todos assustados, todos sabiam o que desejar: paz.

Prólogo – A Espada Vermelha
Era uma tarde de outono e aquele jovem de cerca de um metro e setenta de altura com cabelos ruivos e lisos, de olhos castanhos e sobrancelhas grossas e largas levava um buquê de flores para o cemitério. Zyi era órfão de pai e mãe e rendia todos os anos desde a morte dos mesmos suas homenagens aos pais que tanto admirara.
Naquele dia, o clima estava bom. Pássaros cantavam alegremente e o sol brilhava no céu. Nuvens eram raras e brancas, a brisa soprava constante e suavemente dando àquele rapaz de quinze anos uma sensação muito relaxante.
Ele morava a duas ruas de distância do cemitério, por isso ele fazia o trajeto andando em poucos minutos e gostava disso. Apesar do fato de que a maioria das pessoas não apreciava viver perto de um lugar tão vinculado com a morte, aquele jovem não sentia qualquer incômodo por estar próximo aos túmulos daqueles que foram enterrados ali, naquele vilarejo.
 Andando ritmicamente naquelas ruas de barro, Zyi chegou rapidamente ao seu destino. O cemitério não era grande: devia conter cerca de duzentos a trezentos corpos enterrados, mas o número era muito maior do que a população que ainda residia no Vilarejo da Pena, um lugar pouco lembrado pela as autoridades humanas.
Zyi entrou ali e se dirigiu para o túmulo do seu pai sem se preocupar com as outras tumbas. Ele sabia o que queria e isto não era admirar tumbas de pessoas que não conhecia, nem as flores destinadas a elas.
Ele seguiu o seu caminho rapidamente e atingiu o lugar desejado. Ali, ele se ajoelhou lentamente e colocou o buquê de flores em cima do túmulo da sua falecida mãe.
– Eu sei que você também gosta de flores, papai, mas como você nunca gostou que elas fossem arrancadas, não quis fazer isso com você – sorriu ingenuamente o jovem ajoelhado.
Ele então fechou os olhos e começou a orar. Ele rezou pelas almas dos seus pais e aproveitou para pedir saúde e prosperidade para que ele conseguisse alçar grandes vôos como aqueles que haviam sido suas maiores referências.
Repentinamente, ele sentiu calor, apesar da temperatura agradável que fazia naquela tarde. Era um calor intenso que subiu por todo o seu corpo e o incomodou justamente quando havia acabado de realizar a sua oração.
Assim que Zyi abriu os olhos, ele se deparou com algo que não estava ali antes de ele iniciar sua reza. Era uma espada vermelha com detalhes laranja e amarelo. A bainha tinha as bordas laranja e continha o desenho de um pássaro na mesma cor, mas com detalhes em vermelho na ponta e outro idêntico próximo à guarda. Ao desembainhá-la, ele viu que a lâmina tinha um brilho escarlate, com detalhes em laranja e amarelo, que lembrava o fogo quando movida. Próxima à guarda havia algo gravado:

Zyi não sabia o significado daqueles símbolos, mas imaginava que eles podiam dar uma noção sobre o dono da espada ou o propósito de ela estar ali. Ele tomou-a e a pôs em sua cintura. Quando partisse dali, buscaria o dono dela.
Aquele jovem ainda permaneceu no cemitério por mais meia-hora até perceber que estava começando a ficar tarde. Ele se levantou e deixou para trás a tumba de seu pai e dirigiu-se à sua residência a duas ruas de distância dali.